sexta-feira, agosto 07, 2009

Lisboa, não sejas francesa

Paulo Pena e Sara Belo Luís, in Visão, 6VIII2009:

(...) na cantina da LX Factory (o lugar onde, se quisermos ser optimistas*, Lisboa é mais parecida com Londres), (...)



Lindíssima e praticante de artes performativas. Inconstante e inconsequente, como lhes compete. Ainda por cima, francesa. Se ao prezado leitor parecer que lhe descrevo uma femme fatale será porque é exactamente isso que ela era. Com sorte, todo o homem tem direito a uma e ainda hoje tremo ao pensar que esta pudesse ter sido a minha.

Chegou ao mesmo tempo que eu à também bela cafeteria do V&A, onde o estudante do Imperial ou o turista médio pode desenjoar do caril e do bangers & mash sem gastar uma fortuna. Apesar de, na altura, a distância entre domicílios inspirar cuidados, havia um ano ou dois que não nos víamos. Deixei-me levar pela fantasia de saudades tão avassaladoras quanto súbitas (vanitas vanitatum, et al.) pois nunca se havia atrasado menos que uma hora e ela era dessas de sopetão.

"Vou para o Rio", foi a primeira coisa que me disse depois das efusividades características. Para falar com franqueza, a decisão não me surpreendeu. Globetrotter à séria (por oposição aos que, como eu, não passam de easyjetters ou feriantes de recifes), com apenas 26 anos esta rapariga já tinha vivido pelo menos por um ano em quatro continentes distintos.

"Preciso de qualquer coisa diferente", disse-me, enquanto eu procurava na cadeira uma posição que me inspirasse indiferença à despedida. "As cidades aqui [na Europa] ou já são iguais ou estão a caminho de se tornarem irritantemente iguais".
Pareceu-me uma excelente desculpa. Por isso, desviei a atenção para a morena que passava (também sem grande sucesso) e perguntei-lhe, "iguais em quê?"
"Não há nem nunca houve revoluções em Inglaterra pois aqui os revolucionários são os dandies. Talvez isso os torne fascinantes, mas também por essa razão facilmente a subcultura é institucionalizada, exportada e desencantada. Aquilo que nessas outras cidades as pessoas acreditam ser original e interessante não passa de um émulo de Angel, do Soho, de Notting Hill. Ou então, nos piores casos, de uma moda que não muda por si mesma".

Isto foi há cinco anos, se não me falham as contas. Dá sinais de vida muito de quando em vez e talvez mais realmente quando precisa. Fiel à sua inconstância, já teve mais perto de fugir do Brasil. Crise ultrapassada, vai ficando por lá, cada vez mais sem olhar a datas.
A América do Sul, afinal, é sítio onde dandies e revolucionários raramente se beijam.

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* itálico meu

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