J. G. Ballard, 1930-2009.
Conheço alguns dos argumentos dos amantes da literatura que menosprezam a ficção científica como género. Por exemplo, o argumento de que a f.c. nos dá uma visão optimista do futuro, e uma confiança pouco razoável na tecnologia e na ciência como panaceia para os males da humanidade. É um argumento interessante e aplicável a muita da produção do género. Mas é dificilmente aplicável a muitas das obras e autores mais significativos. Não é aplicável, de todo, a J. G. Ballard, que ontem faleceu vítima de doença prolongada. Porque tal como os melhores autores desse género a que se convencionou chamar ficção científica, Ballard fala sempre do presente, mesmo quando as suas narrativas se situam no futuro. E à semelhança de muitos dos melhores, Ballard descreve um presente/futuro que é mais inquietante do que risonho.
No poema em prosa "What I Believe", publicado em 1984, Ballard sintetizou as suas convicções. E descreveu também muito daquilo que o definiu enquanto escritor:
"I believe in the power of the imagination to remake the world, to release the truth within us, to hold back the night, to transcend death, to charm motorways, to ingratiate ourselves with birds, to enlist the confidences of madmen.
I believe in the non-existence of the past, in the death of the future, and the infinite possibilities of the present."
Era um homem à frente do seu tempo. Melhor dito, e fugindo ao lugar comum, era um homem que conhecia como poucos o seu tempo. Com o surrealismo e a psicanálise como principais fontes de inspiração, Ballard indagou e dissecou o presente com uma lucidez e uma imaginação invulgares. Tentou compreender de que forma os novos espaços (arquitectónicos, tecnológicos, sociais, de consumo, mediáticos e de poder) condicionam e modificam a natureza do Homem contemporâneo. E nisto foi mais audaz, pertinente e visionário que muitos dos filósofos da pós-modernidade.
Como dizia um amigo, num dos sms que trocámos ontem a propósito do desaparecimento de Ballard: morreu "um gigante".
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