Véus há muitos
"Apenas um Estado laico pode proteger os direitos das mulheres", diz-nos o título de um artigo publicado no The Guardian do dia 17.
(no também permitiu que eu tenha chegado lá via Esquerda Republicana)
Num jornal que fez desaparecer da língua inglesa a forma feminina de muitas profissões, Polly Toynbee usa a segregação sexual visível no niqab e hijab das mulheres muçulmanas para atacar o apoio financeiro dado por Blair às escolas anglicanas ou católicas - visto que o leva a subsidiar também, multi-culturalismo oblige, intitutos islâmicos de ensino.
A pirueta é compreensível, e não é por ela que o argumento perde validade. No entanto, ele há uma ou duas preposições cuja consistência inspira cuidados.
Não tenho dúvidas, como diz o(a) senhor(a), que o véu seja "profundamente divisório" e que tenha sido "desenhado para que assim seja". O que não acredito é que o seu uso resulte exclusivamente de uma educação religiosa, subsidiada pelo governo ou pela família.
Num país como o Reino Unido, contando com 800 000 mulheres nascidas e criadas na fé do Profeta, apenas 10 000 tapam a cara.
A coisa tem obrigação de chocar o estrangeiro incauto mas para choque civilizacional sabe a pouco. Ainda para mais, e dados os antecedentes culturais das mesmas, parece-me duvidoso que à maioria desta infeliz minoria algum dia tenha sido permitido frequentar qualquer escola, religiosa ou não.
Também concordo em absoluto com o(a) autor(a) quando diz que "face de nenhum cidadão pode ser considerada indecente por causa do seu sexo".
Mas é precisamente aqui que a porca torce o proverbial rabo.
Começa a ser frequente lêr na imprensa britânica comentários de mulheres que, embora nunca até à universidade (laica) tenham usado qualquer tipo de cobertura ou sido pressionadas pela família para o fazer, resolvem subitamente fazer uso do expediente para melhor se esconderem de olhares indesejados.
É muito triste que sintam tal necessidade mas, como diz a divisa da rainha delas, "honi soit qui mal y pense".
Não quero com isto dizer que não existem, na mais ingénua das hipóteses, as tais dez mil situações aberrantes de opressão que o Estado britânico, por admitir e financiar um tipo de ensino confessional, pode vir a multiplicar.
Mas parece-me mais consonante com os valores de quem defende a dignidade de ser humano contra qualquer crença ou doutrina que esconder a cara numa sociedade que se quer laica é nada mais que um comportamento anti-social e nenhuma justificação existe que nos obrigue a aceitá-lo num local de trabalho.
Digo eu, que tampouco me agradaria andar de autocarro com um motorista - homem - de balaklava.
3 comentários:
Não percebi essa de o «The Guardian» ter feito desaparecer «a forma feminina de muitas profissões»...
Quanto à substância do teu argumento, eu cá sou favorável ao uso obrigatório da mini-saia no inverno.
No verão, G-string.
Uma actress passou a ser designada actor, por exemplo. Isto para proteger o leitor das suas próprias tendências sexistas.
Quanto à tua proposta, parece-me que dado o rigor do clima seria impraticável em Portugal.
«Uma actress passou a ser designada actor, por exemplo. Isto para proteger o leitor das suas próprias tendências sexistas.»
Ahn?! Não sabia...
«Quanto à tua proposta, parece-me que dado o rigor do clima seria impraticável em Portugal.»
Nada que uns bons colãs não resolvam. Ou uma termotebe...
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